Sem recursos
Mudanças de vida através da educação
No último episódio da série Os braços da educação federal em Pelotas, o significado do Campus Pelotas do IFSul
Gabriel Huth -
"O lugar de onde tu vens não quer dizer onde tu pode chegar - isso eu aprendi aqui dentro". Ouvir Orham Fernandes contar sua história faz pensar o quanto uma instituição como Campus Pelotas, do Instituto Federal Sul-rio-grandense (IFSul), é capaz de transformar a vida das pessoas. Todos os dias, Orham precisar acordar às 4h30 para pegar um ônibus no município de Arroio Grande por volta das 5h30, e para lá retorna depois das 23h. Orham é um dos alunos que integram o Laboratório 14, reconhecido dentro e fora do Brasil como um celeiro de cabeças criativas e ideias inovadoras no mundo da tecnologia. Com o corte de 30% do orçamento de custeio, as portas do câmpus podem ser fechadas em julho.
Máquina desenvolvida pelo Laboratório 14 apresentada por Orham Fernandes, estudante. (Fotos: Gabriel Huth - Especial - DP)
Ao todo são 76 anos de história desde a fundação da Escola Técnica de Pelotas (ETP). Hoje representa o maior câmpus de institutos federais no Estado com mais de 5 mil alunos. "É uma instituição que tem como característica mudar a vida das pessoas", resume o vice-diretor Rubinei Ferraz.
Orham hoje é estudante de graduação no IFSul. Saiu direto do ensino médio técnico para a faculdade, o que lhe proporciona uma continuidade dentro do instituto. De amizades, projetos, estudos, relação com professores. "Eu sempre digo para os que estão começando: o laboratório é uma janelinha de acesso para o mundo. A gente tem colegas reconhecidos na França, nos Estados Unidos, em feiras internacionais", cita, exaltando a expertise desenvolvida na sala, coordenada por Rafael Galli.
No entanto, lembra, para manter as atividades e os projetos de inovação tecnológica desenvolvidas no laboratório, são necessários investimentos constantes em equipamentos e na compra de materiais para desenvolver as pesquisas. Sem recursos, opina, naturalmente são excluídos aqueles estudantes sem condições de arcar com o material.
Inovação pode paralisar sem recursos
"O nosso câmpus é todo voltado para a área industrial. São pesquisas, inovações tecnológicas, projetos em andamento que serão suspensos sem o recurso de custeio. Não teremos como manter visitas técnicas, micro estágios, laboratórios", sinaliza Carlos Corrêa, diretor-geral do câmpus. A suspensão dos recursos projetados, afirma, mexem com toda uma engrenagem econômica relacionada ao funcionamento diário do instituto.
"O corte atinge famílias que trabalham com transporte e trazem alunos diariamente pra cá, atinge o comércio do entorno, cantinas, trailers. Ceifa o desenvolvimento de tecnologias, limita o acesso de jovens talentos, acaba com a inovação. Retira o que é uma das possibilidades de desenvolvimento da metade sul do Estado", manifesta o diretor.
Inicialmente, o orçamento projetado para 2019 era de R$11,5 milhões. Com o corte feito pelo Ministério da Educação (MEC), o valor caiu para R$7,2 milhões. Os R$4,3 milhões a menos inviabiliza a participação de eventos, cancelamento de estágios, bolsas de pesquisa e atividades culturais. Para investimentos, como compra de equipamentos e manutenção do prédio, estão disponibilizados somente R$10 mil. Em 2013, o valor era de R$4,8 milhões.
60 projetos afetados
Entre projetos de pesquisa e extensão, o corte afeta 60 iniciativas. O orçamento de custeio é responsável por projetos como o de qualificação para pessoas fora do mercado de trabalho e em situação de vulnerabilidade - na última edição foi ofertado o curso para eletricista residencial. São feitas parcerias com empresas da região, é desenvolvido um projeto de assessoria a catadores de lixo, um curso técnico em edificações na modalidade Educação de Jovens e Adultos (EJA) para trabalhadores da construção civil. "São projetos que mudam a perspectiva de vida de diversas pessoas, que sonham com um diploma, que buscam uma renda. Em qualquer indústria que a gente vai a gente encontra um ex-aluno", indica o Rubinei.
A estrutura
Todos os professores, coordenadores e diretores ouvidos pela reportagem um dia estiveram no Câmpus Pelotas como estudantes. Ao todo são 358 professores e 216 técnicos administrativos. Hoje, estudam no Câmpus Pelotas alunos oriundos de 19 municípios da região. São 10 cursos técnicos nível médio, nove graduações, cinco especializações e dois mestrados. Um programa criado e chamado de "Profuncionário" oferece cursos sobre alimentação escolar, infraestrutura escolar, multimeios didáticos e secretaria escolar dedicados a profissionais que atuam no ensino básico da região.
Demissões
Integram os serviços diários do Câmpus Pelotas 131 trabalhadores terceirizados que podem ser demitidos, caso o corte não seja revisto, em função da instituição não ter condições de honrar com estes compromissos. Outros afetados serão estagiários de outras instituições que desenvolvem atividades no local. Ao todo, são 149 estagiários que podem perder suas bolsas.
Movimentos em Brasília
O reitor do IFSul, Flávio Nunes, está reunido nesta semana em Brasília com outros reitores integrantes do Conselho Nacional das Instituições da Rede Federal de Educação Profissional, Científica e Tecnológica (Conif) para tentar reverter o corte. Hoje, os reitores estarão reunidos com o ministro Abraham Weintraub às 10h para apresentar argumentos sobre os prejuízos causados nas comunidades com o corte. "Visitamos deputados e senadores gaúchos no final da tarde de ontem (quarta-feira) para que eles se somem na nossa luta pela reversão da medida. Fica o registro da importância de uma série de manifestações que têm ganhado as ruas do país em defesa da educação", informou Flávio no final da tarde de ontem. O movimento é fundamental para pressionar o governo para rever o corte, disse.
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